Há uma teoria em Direito Constitucional bem
interessante, denominada Teoria do Impacto Desproporcional.
Ela já foi utilizada pelo MPF, especificamente
pela Vice-Procuradora-Geral da República Deborah Duprat, na ADI 4424, e, no
dizer de Joaquim Barbosa, consiste:
“Toda e qualquer
prática empresarial, política governamental ou semigovernamental, de cunho
legislativo ou administrativo, ainda que não provida de intenção
discriminatória no momento de sua concepção, deve ser condenada por violação do
princípio constitucional da igualdade material se, em consequência de sua
aplicação, resultarem efeitos nocivos de incidência especialmente
desproporcional sobre certas categorias de pessoas”
Essa teoria tem suporte no direito norte-americano
(precedente Griggs vs Duke Power Co.), sendo possível a constatação de violação
ao princípio da igualdade quando os efeitos práticos de determinadas normas, de
caráter aparentemente neutro, causem dano excessivo, ainda que de forma não
intencional, aos integrantes de determinados grupos vulneráveis.
No âmbito interamericano, a Corte
Interamericana de Direitos Humanos utilizou essa teoria no Caso Yatama vs.
Nicarágua, uma vez que algumas condições de elegibilidade impostas por esse
Estado acabaram por afetar diretamente as comunidades indígenas, que não
conseguiam representatividade de acordo com as normas eleitorais.
Consigno que tenho aplicado a teoria do impacto
desproporcional também contra decisões jurisprudenciais que acabam por violar
direitos essenciais. Melhor explicando: Como estou em juizado especial, tenho
julgado também ações de dano moral causado a pessoas jurídicas. Ocorre que o
STJ é firme de que só cabe dano moral para PJ quando houver dano à sua honra
objetiva, devendo a parte lesada provar esse dano.
Todavia, como pode uma microempresa ou uma
pessoa jurídica de pequeniníssimo porte provar dano à honra objetiva
(reputação)? Ela teria que arcar com pesquisas junto à clientela e outros
dispêndios que seriam deveras absurdos frente às violações de seus direitos do
consumidor.
Nesses casos, tenho entendido que a
jurisprudência acaba por causar um impacto desproporcional às pequenas
sociedades empresárias.
Assim justifiquei em sentença publicada ontem:
“No caso, tenho que houve, de
fato, violação ao direito da sociedade empresária autora enquanto consumidora,
mas a proteção dada pela jurisprudência se restringe à esfera objetiva da
pessoa jurídica.
Nesse sentido:
“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
INTERRUPÇÃO DE SERVIÇO DE ENERGIA. DANO MORAL. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO.
1. A pessoa jurídica pode sofrer
dano moral desde que haja ferimento à sua honra objetiva, ao conceito de que
goza no meio social.
2. O mero corte no fornecimento
de energia elétrica não é, a principio, motivo para condenação da empresa
concessionária em danos morais, exigindo-se, para tanto, demonstração do
comprometimento da reputação da empresa” (STJ, REsp 1298689 / RS, relator Min.
Castro Meira, DJE de 15/04/2013).
Ainda que não seja necessário
realizar, neste específico caso, uma superação (overruling) da jurisprudência, é necessário registrar que tal
entendimento acaba por gerar um impacto desproporcional às
sociedades empresárias consumidoras. Ora, em casos análogos, todavia
trocando-se o polo ativo para uma pessoa física, ter-se-ia dano moral
configurado, enquanto que, para pessoas jurídicas, exige-se um ônus probatório
beirando o diabólico, até porque a comprovação de violação à reputação objetiva
importaria em análise de opiniões da clientela e outras pesquisas que
importariam enorme dispêndio às pequenas sociedades empresárias –como no caso
dos autos, sendo a autora microempresa”.
Enfim, o que acham?
P.s.: Este post teve muito amparo no livro "Jurisprudência internacional de Direitos Humanos", do Caio Paiva e Thimotie Heeman. Indico-o, eis que está sendo um ótimo meio de entender as decisões internacionais. Eu o comprei aqui.
Grande abraço. :D